Este post trata exclusivamente do caso em que o credor é advogado privado. Para a advocacia
pública existem diferenças que não são tratadas aqui e que ainda devem ser
objeto de atos normativos internos de cada órgão.
Introdução
Examino as hipóteses de
cabimento de ação autônoma para definição e cobrança de honorários de sucumbência.
A previsão legal dessa ação
é recente. Veio com o CPC/2015:
Art. 85. [...] § 18.
Caso a decisão transitada em julgado seja omissa quanto ao direito aos
honorários ou ao seu valor, é cabível ação autônoma para sua definição e cobrança.
A opção do legislador
corresponde parcialmente ao que defendi em Sentença
obscura e trânsito em julgado, obra publicada pela Livraria do Advogado em
2013. Minha tese, que não era especificamente sobre honorários nem sobre omissão,
era de que, (1) quando a sentença apresenta um grau de obscuridade que torna
impossível a interpretação, ela é citra petita
e, como tal, permite nova propositura da ação (p. 83). Por outro lado, (2) quando,
apesar de obscura, a sentença ainda admite interpretação, caberia ao juiz da
execução interpretá-la e caberia, alternativamente, uma ação autônoma para sua interpretação
(p. 124). A ação prevista no CPC/2015, art. 85, § 18, corresponde à primeira
hipótese, exclusivamente.
Com a novidade trazida pelo
CPC/2015, surgiram dúvidas sobre a forma de operacionalização da ação autônoma,
bem como sobre permanência da validade do entendimento do STJ sobre a questão
(Súmula 453 vs REsp 1.129.830/SC vs REsp 886.178/RS).
Analisam-se, assim, os
seguintes temas: Interpretação do texto legal, sua aplicação no tempo,
hipóteses de cabimento da ação autônoma e prazo. Ao final, apresenta-se uma
minuta básica de petição inicial.
Interpretação CPC/2015, art. 85, § 18
Decisão transitada em
julgado é aquela que passa da situação de
recorrível para a de irrecorrível. Normalmente, uma decisão pode transitar
em julgado antes que a fase de conhecimento seja encerrada. Isso ocorre, por
exemplo, quando algum dos pedidos é julgado, ninguém recorre tempestivamente da
decisão desse pedido e alguém recorre do julgamento de outros pedidos não
prejudiciais ao pedido irrecorrido. Conforme entendimento jurisprudencial e o
CPC/2015, para fins de ação rescisória, não se considera o trânsito em julgado
de capítulos, isto é, conta-se o prazo exclusivamente “do trânsito em julgado
da última decisão proferida no processo” (art. 975). No caso dos honorários,
ocorre algo parecido, pois mesmo que algum capítulo transite em julgado antes
do final da fase de conhecimento, os recursos quanto aos demais capítulos
sempre podem ter reflexos no montante final dos honorários (art. 85, § 11).
Isso faz com que a definição ou
indefinição da verba honorária somente passe em julgado com o trânsito da
última decisão proferida no processo.
Decisão omissa é aquela que não se pronuncia a respeito de ponto sobre o
qual deveria se pronunciar. Dessa forma, a sentença que decide o mérito, mas
não condena o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor, é omissa. O
mesmo pode ser dito do acórdão que reforma a sentença, mas não faz a
correspondente adequação na condenação em honorários.
A decisão que simplesmente
afirma inverter o ônus da sucumbência
trata apenas da responsabilidade
quanto aos honorários e não do valor
destes. Os honorários fazem parte dos encargos (expressão mais adequada do que
ônus) da sucumbência. Invertido o encargo, a responsabilidade de arcar com os honorários passa de uma das partes
para a outra. Mesmo sem tratar do valor,
a decisão que emprega a expressão “invertidos os ônus da sucumbência” é comum
na prática forense e não é necessariamente omissa (contra REsp 980.570/RS, que
entendeu que apenas custas e despesas seriam encargos da sucumbência, e não os
honorários). É possível entender, nesses casos, que o acórdão reformou a
sentença quanto ao direito aos
honorários, mas manteve-a intacta quanto ao valor.
Isso funciona quando o valor estabelecido pela sentença está expresso em moeda
corrente ou quando consiste de percentual sobre o valor da causa. Quando, porém, os honorários são fixados em
percentual da condenação, e ao final
o pedido é julgado improcedente (ou seja, não há condenação), ocorre omissão no que se refere ao valor dos
honorários (tratam do tema EDcl no AgRg no AgRg no REsp 1.362.094/MG; REsp
1.272.024/RS; REsp 1.129.830/SC).
Ação autônoma para definição e cobrança não é execução.
O entendimento expresso na Súmula 453/STJ continua válido no que se refere à impossibilidade de execução direta da
sentença omissa. Confira-se o texto da referida súmula: “Os honorários sucumbenciais, quando omitidos em decisão transitada em
julgado, não podem ser cobrados em execução ou em ação própria.” A súmula,
contudo, está superada na parte que afirma não caber ação própria, pois esta
passou a ser cabível com o novo CPC. A ação prevista no art. 85, § 18, é de
rito ordinário e inicia pela fase de conhecimento. Na fase de conhecimento da
ação prevista no art. 85, § 18, o juiz definirá o valor e condenará o réu ao
pagamento dos honorários, em caso de procedência. Em seguida, sine intervallo, mas a pedido do
exequente, passa-se à fase de cumprimento (CPC/2015, art. 513, § 1º).
Aplicação do CPC/2015 no tempo
A aplicação da nova lei
processual aos processos em curso sempre foi um tema tormentoso e as
DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS do CPC/2015 estão longe de eliminar todas as
dúvidas. Sem a preocupação de dar um tratamento teórico completo ao tema,
faz-se necessário, ao menos, escolher o caminho que pareça mais seguro para
fins práticos.
A teoria dominante na
doutrina do direito intertemporal processual é a do sistema de isolamento dos atos processuais (sobre o tema, ver
AMARAL, Estudos de direito intertemporal
e processo, 2007, p. 20). Por esse sistema, respeita-se a eficácia dos atos
já realizados no processo, mas para os atos a praticar na vigência da lei nova,
aplica-se esta. Com esse objetivo, o Código diz:
Art. 1.046. Ao
entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos
processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de
1973.
Ocorre que um ato praticado
sob a lei anterior pode gerar direitos
processuais como, por exemplo, o direito de interpor determinado recurso
que na data da prática do ato era cabível (ver Teresa WAMBIER, Os agravos no CPC brasileiro, 2000, p.
487). Em atenção a tal critério, o STJ editou o Enunciado administrativo n. 2:
Aos recursos interpostos com fundamento no
CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016)
devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista,
com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça.
Esse critério se aplica no
caso de processos pendentes.
Quanto aos processos findos, porém, é a coisa julgada que importa. Formada a coisa julgada de acordo com
determinada lei processual, ela não perde essa qualidade caso uma lei nova
introduza um novo conceito de coisa julgada (ver AMARAL, Estudos de direito intertemporal e processo, 2007, p. 23). Esse é o
critério para os processos findos.
Para o tema aqui examinado,
importa saber se a decisão transitada em
julgado omissa quanto ao direito aos honorários ou ao seu valor faz coisa
julgada material ou não. A ausência de coisa julgada material, tanto no CPC
anterior (art. 268) como no atual (art. 486), não obsta a que a parte proponha
de novo a ação (caso em que caberia a ação prevista no CPC/2015, art. 85, §
18). Quando há coisa julgada material, contudo, a única via possível é a ação
rescisória (ou seja, não caberia a ação prevista no CPC/2015, art. 85, § 18).
Parece-me que a omissão
quanto ao direito aos honorários ou ao seu valor não faz coisa julgada, na linha da ressalva de voto feita pelo
Relator do RESP (repetitivo) 886.178/RS, Ministro Luiz Fux:
Ressalva do Relator no sentido de que o acórdão, que não fixou honorários em
favor do vencedor, não faz coisa julgada, o que revela a plausibilidade do ajuizamento de ação
objetivando à fixação de honorários advocatícios. Isto porque a pretensão à
condenação em honorários é dever do juiz e a sentença, no que no que se refere
a eles, é sempre constitutiva do direito ao seu recebimento, revestindo-o do
caráter de executoriedade, por isso, a não impugnação tempestiva do julgado,
que omite a fixação da verba advocatícia ou o critério utilizado quando de sua
fixação, não se submete à irreversibilidade decorrente do instituto da coisa
julgada. (REsp 886.178/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Corte Especial,
julgado em 02/12/2009, DJe 25/02/2010)
Ocorre que, conforme
adiantado, a finalidade deste estudo é prática. Assim, o que importa é que o
trecho citado é apenas uma ressalva de
voto e a decisão da Corte Especial do STJ, no CPC/1973, foi pelo não
cabimento da ação autônoma e reconhecimento de “coisa julgada, passível de modificação apenas mediante o ajuizamento de
ação rescisória.” Posteriormente, o precedente levou à edição da Súmula
453:
Os honorários sucumbenciais, quando omitidos em
decisão transitada em julgado, não podem ser cobrados em execução ou em ação
própria.
Em suma, o STJ entendia que
a omissão fazia coisa julgada material, pois somente esta impede a ação própria
com um dos objetos da ação anterior.
A súmula restou parcialmente
superada pelo CPC/2015, que seguiu a corrente doutrinária que me parece mais
correta. A súmula ficou superada pela lei apenas na parte que veda a ação própria. Está mantida na parte que veda execução pura e simples de
honorários, sem que a decisão transitada em julgado os tenha fixado. Note-se
que o CPC/2015, art. 85, § 18, necessariamente adota o entendimento de que o
ponto omitido não faz coisa julgada material.
Note-se que tanto a Súmula
453/STJ como CPC/2015, art. 85, § 18, tratam de decisão transitada em julgado, o que reforça a conclusão de que é a data do trânsito em julgado o elemento
que define a aplicação do CPC antigo ou do novo, nesse caso. O trânsito em
julgado deve ser o marco para a escolha da lei aplicável quando se trata de ação nova. A data da publicação da decisão (critério adotado pelo STJ para os
recursos) serve apenas como elemento de conexão para eleição da lei aplicável
aos processos pendentes, não aos
transitados em julgado. No processo pendente, verifica-se uma conexão entre o
ato anterior e o posterior, há uma sequencia concatenada de atos, o que algumas
vezes faz com que o ato posterior, mesmo na vigência da lei nova, deva ser praticado
de acordo com a lei antiga, vigente na data do ato anterior. Não fosse assim,
nos casos em que a lei nova deixasse de prever determinado recurso, as partes
seriam privadas de um recurso que poderiam, legalmente, ter interposto antes da
alteração legal, o que viola o direito adquirido. Uma decisão omissa proferida
antes de 18/03/2016 permanece regida pelo CPC/1973 quanto ao recurso cabível.
Mas, uma vez passado o prazo para o recurso e ocorrido o trânsito em julgado,
aquela decisão anterior a 18/03/2016 já não tem conexão com os atos futuros,
até porque, com o trânsito em julgado, “considerar-se-ão
deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor
tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido” (CPC/2015, art. 508).
De todo o exposto, aceitando
a súmula 453/STJ como correta, apenas para fins práticos, e parcialmente
superada pelo CPC/2015, conclui-se que a ação autônoma para definição e
cobrança de honorários é cabível apenas quando a decisão omissa tenha transitado em julgado a partir de
18/03/2016, inclusive.
Hipóteses de cabimento: a tese da decisão implícita
A hipótese de cabimento da
ação própria é a de sentença omissa transitada em julgado, tal qual definido
acima.
Pode surgir alguma dúvida
quanto à necessidade da ação frente
ao entendimento que o STJ adotou em alguns julgados, no sentido de que a reforma integral da decisão recorrida
permitiria ver uma condenação implícita, consistente na inversão dos encargos
da sucumbência, entre eles os honorários. Nessa linha:
A reforma in totum do acórdão ou da
sentença acarreta inversão do ônus da sucumbência, ainda que não haja pronunciamento explícito sobre esse ponto.
Precedentes. (REsp
1129830/SC, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 23/02/2010,
DJe 08/03/2010)
1. Havendo modificação do meritum causae, ocorre a
inversão dos ônus sucumbenciais; nesse caso, o órgão julgador estará acolhendo
ou rejeitando o pedido inicial, decorrendo, disso, as despesas processuais e os
honorários advocatícios. 2. Como não
houve, na decisão recorrida, menção expressa à inversão da sucumbência, embora
referida inversão seja efeito implícito da decisão, são cabíveis embargos
de declaração para esclarecer esse fato. Embargos de declaração acolhidos, para
sanar a omissão, sem efeitos infringentes, com expressa inversão da sucumbência
(EDcl no REsp. Nº 892.119 - RS, Segunda Turma, Rel. Min. Humberto Martins,
julgado em 2.12.2008)
Se o acórdão, em dando provimento
integral a apelação, reverteu o dispositivo da sentença reformada, sem fazer
referência aos ônus da sucumbência, é de
se entender tenha, por igual, invertido a condenação imposta na decisão
reformada. (EREsp 53.191/SP, Corte Especial, Rel. Min. Humberto Gomes de
Barros, DJU 28.02.2000).
Esse entendimento ainda é adotado
em alguns julgados recentes, como, por exemplo, nos EDcl no REsp 1.184.500/RS,
julgados em 19/04/2016, e nos EDcl no REsp 1556350/RS, julgados em 23/02/2016.
Nada obstante, parece-me que
a ação autônoma para definição e cobrança dos honorários é perfeitamente
cabível, e até mesmo necessária, nos casos que poderiam, teoricamente, se
enquadrar na jurisprudência citada. São três as razões desse entendimento:
Primeiro, porque o
entendimento jurisprudencial citado era incorreto e violava inclusive a Constituição.
O pedido implícito é possível, desde
que previsto em lei (CPC/2015, art. 322, § 1º), mas decisão implícita não, até porque toda a decisão precisa ser
fundamentada (CRFB/1988, art. 93, IX). A decisão que não julga um pedido, seja
ele implícito ou explícito, é simplesmente omissa.
Segundo, porque o
entendimento citado já estava superado pela jurisprudência do STJ, ainda na
vigência do CPC/1973. Existem realmente julgados recentes que ainda sustentam a
ocorrência de decisão implícita
quanto aos honorários. Contudo, são geralmente acórdãos da Segunda Turma e não
posição pacífica. A corrente oposta, que entende que a omissão corresponde à
ausência de condenação, tem se mostrado predominante, tanto que prevaleceu no
julgamento do Recurso Especial repetitivo 886.178/RS, levou à edição da Súmula
453/STJ e, em período mais recente, prevaleceu no julgamento do EREsp
1.285.074/SP, todos da Corte Especial.
Nos Embargo de Divergência 1.285.074/SP, aliás, o paradigma invocado pela
embargante foi justamente o REsp 1.129.830/SC, que adotava o seguinte
posicionamento: “A reforma in totum do
acórdão ou da sentença acarreta inversão do ônus da sucumbência, ainda que não
haja pronunciamento explícito sobre esse ponto.” Ao rechaçá-lo, a ementa do acórdão do EREsp 1.285.074/SP
diz que o “acórdão paradigma ostenta
posicionamento superado”.
Terceiro, porque o
entendimento citado está superado pela previsão de ação autônoma para o caso,
pelo CPC/2015. Não há dúvida de que a falta de pronunciamento quanto aos
honorários, seja na sentença ou em acórdão que reforma decisão anterior, em
qualquer instância, representa omissão. E, para esse caso, o CPC/2015, art. 85,
§ 18, trouxe nova solução. Logo, não pode prevalecer a solução anterior. Além
do mais, a jurisprudência buscava dar solução a um problema: uma vez que o STJ
entendia que a coisa julgada abrangia inclusive o pedido de honorários, mesmo
sem decisão quanto a estes, a jurisprudência buscou evitar a penalização
advogado que trabalhou no processo, teve sucesso na demanda, e por um lapso
seu, mas também do tribunal, ficaria sem a sua remuneração. Com o CPC/2015,
esse problema desapareceu, não se justificando a permanência da solução antiga.
Convém diferenciar “inversão
da sucumbência” de “inversão do ônus da sucumbência”. Inverter a sucumbência é simplesmente tornar
vencedor quem até então era vencido, e vice-versa. Essa expressão nada diz
quanto aos honorários. Diversamente, inverter o ônus da sucumbência é inverter a responsabilidade pelos encargos
que decorrem da sucumbência. Essa expressão inclui a condenação em honorários.
Muito frequentemente, porém, essas expressões não são usadas de forma técnica.
Será importante, em todos os casos, buscar descobrir, pelo contexto, o sentido
no qual a expressão foi utilizada. O que importa é que, quando o acórdão afirma
inverter o ônus da sucumbência, mesmo
que o diga com outras palavras, ele está condenando uma das partes a arcar com
os honorários de sucumbência. Ocorre que, muitas vezes, a mera inversão leva à
omissão quanto ao valor dos honorários.
É o caso, por exemplo, quando a sentença condena em percentual sobre a
condenação e, com a reforma pelo acórdão, pedido julgado improcedente, a
condenação (ao principal) desaparece.
As diferentes situações
podem ser visualizadas no seguinte quadro:
Sentença (ou acórdão regional)
|
Acórdão
|
Solução
|
Omissa quanto
ao responsável pelos honorários ou quanto ao valor
|
-------
|
Ação autônoma
|
Condena o vencido a honorários (qualquer base de cálculo)
|
Reforma a decisão recorrida mas não trata dos honorários
|
Ação autônoma
|
Reconhece a improcedência e condena o vencido a
honorários sobre o valor da causa (ou
valor fixo)
|
Reforma integralmente (pedido procedente) e inverte expressamente os ônus (encargos)
da sucumbência
|
Pedido de cumprimento nos mesmos autos
|
Reconhece a procedência do pedido e condena o vencido a
honorários sobre o valor da condenação
|
Reforma integralmente (=pedido improcedente) e inverte expressamente os ônus (encargos)
da sucumbência
|
Ação autônoma
|
Em conclusão: ainda que
ocorra reforma integral da decisão a quo,
caso não haja pronunciamento explícito sobre os encargos da sucumbência no
acórdão ad quem e este venha a
transitar em julgado na vigência do CPC/2015, a ação prevista no CPC/2015, art.
85, § 18, será cabível e necessária.
Prazo
Para saber se a ação em
questão está sujeita a prazo, é necessário, antes, saber se ela estaria sujeita
a prazo prescricional ou decadencial. Isso porque a prescrição pode incidir por
critério residual (CC/2002, art. 205) enquanto a decadência precisa estar prevista
em lei ou convenção.
A classificação não é
tranquila, mas um critério frequentemente tomado como ponto de partida é o da ação adequada para a tutela de cada tipo de
direito. Agnelo Amorim Filho resume-o da seguinte forma:
1) - Estão sujeitas a prescrição (indiretamente, isto é, em virtude da prescrição da
pretensão a que correspondem): - tôdas as ações
condenatórias, e somente elas (arts. 177 e 178 do Cód. Civil);
2) - Estão sujeitas a decadência (indiretamente, isto é, em virtude da decadência do direito
potestativo a que correspondem): - as
ações constitutivas que têm prazo especial de exercício fixado em lei;
3) - São perpétuas
(imprescritíveis): - a) as ações
constitutivas que não têm prazo especial de exercício fixado em lei; e b) tôdas as ações declaratórias.
(AMORIM FILHO, Critério científico para distinguir a
prescrição da decadência e para identificar as ações imprescritíveis, 1962, p.
131)
Resta avaliar o direito aos
honorários de sucumbência por esse critério. Segundo o CPC/2015, art. 85, “A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.”
O mesmo constava do CPC/1973, art. 20. Logo, o provimento adequado à tutela do
direito aos honorários de sucumbência é o condenatório
e o prazo para o seu exercício é prescricional.
Da sucumbência surge o direito aos
honorários e com o trânsito em julgado da decisão omissa, ocorre a violação ao
direito, e “violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se
extingue, pela prescrição” (CC/2002, art. 189).
Tanto o CC/2002, art. 206
como o EOAB/1994 fixam prazo prescricional aplicável ao caso. Felizmente, o
prazo em ambas as leis é idêntico: cinco anos. Confira-se:
Lei n. 8.906/1994 (EOAB). Art. 25. Prescreve em cinco anos a ação de cobrança de honorários de advogado,
contado o prazo: [...] II - do trânsito
em julgado da decisão que os fixar; [...] IV - da desistência ou transação; [...].
Lei n. 10.406/2002 (CC). Art. 206. Prescreve: [...] §
5o Em cinco anos: [...] II - a
pretensão dos profissionais liberais em geral, procuradores judiciais, curadores e professores pelos seus honorários, contado o prazo da conclusão dos serviços, da cessação
dos respectivos contratos ou mandato; III - a pretensão do vencedor para haver do vencido o que despendeu em
juízo.
Ambos os dispositivos apresentam
certas dificuldades de aplicação à ação prevista no CPC/2015, art. 85, § 18.
Quanto ao EOAB/1994, ele
trata apenas da ação de cobrança e
ainda diz que o prazo é contado da decisão que
fixar os honorários. Mas a ação prevista pelo CPC/2015 não é simplesmente
de cobrança, mas de definição e cobrança, sendo que primeiro é preciso a
definição para depois haver a cobrança, no mesmo processo. Além disso, na
hipótese em estudo, não há uma decisão que
fixa os honorários, mas uma decisão que dá vitória a uma das partes (ou a
ambas, parcialmente), o que constitui suporte fático para as normas legais
relativas aos honorários de sucumbência. O EOAB/1994 tratou apenas da situação
normal: uma sentença que fixa os honorários. Não cuidou do caso da sentença omissa.
Quanto ao CC/2002, art. 206, o inciso II é
bastante amplo. Ele trata da pretensão
aos honorários, e não apenas da sua cobrança. Além disso, não se restringe
às verbas de origem contratual. Por essas razões, esse dispositivo é o que regula o prazo para a ação do CPC/2015, art.
85, § 18. A jurisprudência a respeito é escassa. Um dos poucos julgados do
STJ sobre o tema apoia o entendimento aqui defendido:
CIVIL E PROCESSO CIVIL. HONORÁRIOS. CONTRATAÇÃO
VERBAL. COBRANÇA. PRESCRIÇÃO. PRAZO. CONTAGEM. DIES A QUO. DISPOSITIVOS LEGAIS
ANALISADOS: ARTS. 25 DA LEI Nº 8.906/94 E 206, § 5º, II, DO CC/02. [...] 4.
Embora, com base no princípio da especialidade, a regra específica do art. 25,
II, da Lei nº 8.906/94 deva prevalecer sobre o comando geral do art. 206, § 5º,
II, do CC/02, aquela norma legal se refere exclusivamente à prescrição da ação
de cobrança de honorários de advogado, inexistindo qualquer alusão à ação de
arbitramento. Portanto, ausente no Estatuto da OAB comando específico para a
tutela da prescrição da ação de arbitramento de honorários advocatícios,
aplica-se a regra geral contida no
Código Civil, cuja redação é mais abrangente, comportando inclusive a pretensão
de fixação da verba. 5. Embora pormenorizadas, as hipóteses enumeradas no
art. 25 da Lei nº 8.906/94 se subsumem na previsão do art. 206, § 5º, II, do
CC/02, de sorte que, independentemente da norma aplicada, o prazo prescricional
para exercício da pretensão de arbitramento e/ou cobrança dos honorários
advocatícios judiciais verbalmente contratados será sempre de 05 anos, contado
do encerramento da prestação do serviço (trânsito em julgado da decisão final
ou último ato praticado no processo, conforme o caso). 6. Recurso especial a
que se nega provimento. (REsp 1358425/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi,
Terceira Turma, julgado em 08/05/2014, DJe 26/05/2014)
Em conclusão, a ação
prevista no CPC/2015, art. 85, § 18, está sujeita a prazo prescricional de cinco anos,
contados do trânsito em julgado do
processo em que proferida a decisão omissa. Base legal: CC/2002, art. 206, II.
(modelo adaptado a partir
de SCAVONE JÚNIOR, Luiz Antonio. Modelos
de peças no novo Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2015,
p. 157-160)
EXCELENTÍSSIMO(A) JUIZ(A) DA ___ VARA _____________
[...], em causa própria, vem, com base CPC/2015, art. 85, § 18, propor AÇÃO PARA DEFINIÇÃO E COBRANÇA
DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA em face de [...], o que faz com apoio
nos argumentos de fato e de direito que passa a expor:
I – Fatos
O autor atuou diligentemente no processo [...]
e conseguiu ver reconhecido o direito de seu cliente. No entanto, o acórdão que
reformou integralmente a sentença de procedência, dando assim vitória ao Réu na
ação anterior, deixou de manifestar-se sobre os honorários de sucumbência.
Sendo assim, diante da impossibilidade de arbitrar unilateralmente a verba
sucumbencial, bem como de executá-la sem condenação expressa (STJ 453), não
restou alternativa ao autor senão a propositura da presente ação.
II – Direito
Conforme o Estatuto da OAB:
Art. 22.
A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos
honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de
sucumbência. [...]
Art. 23.
Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência,
pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença
nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja
expedido em seu favor.
E conforme o CPC/2015:
Art.
85. A sentença condenará o vencido a
pagar honorários ao advogado do vencedor. [...]
§
14. Os honorários constituem direito do
advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos
oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de
sucumbência parcial. [...]
§
19. Os advogados públicos perceberão
honorários de sucumbência, nos termos da lei.
A lei deixa claro, portanto, que a sucumbência
da parte vencida a torna devedora de honorários advocatícios e que o juiz deve
proferir condenação ao seu pagamento.
III – Demonstração do valor devido
No processo [...], o pedido foi julgado
integralmente improcedente. No que se refere aos honorários advocatícios, a
situação é regida pelo CPC/2015, art. 85, § 4º:
§ 4o Em
qualquer das hipóteses do § 3o:
III -
não havendo condenação principal ou não sendo possível mensurar o proveito
econômico obtido, a condenação em honorários dar-se-á sobre o valor atualizado
da causa;
O valor da causa, nos autos originários, era
de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), hipótese na qual incide um percentual
mínimo de oito e máximo de dez por cento (CPC/2015, art. 85, § 3º, II). Levando
em conta a complexidade da causa [...descrever...], o zelo do advogado que atuou
no feito [... descrever....], e que a vitória somente foi obtida em grau
recursal (§ 11), o percentual merece ser fixado no máximo legal.
IV – Pedido
Em razão do exposto, o/a autor pede seja o réu
condenado:
(1) a pagar honorários de sucumbência
referentes ao processo [...] no montante de R$ 100.000,00, corrigido desde
[...data da inicial originária ...] e com juros a contar da citação da presente
demanda.
(b) nas despesas, custas e honorários
advocatícios referentes à presente demanda, na forma da lei.
V – Citação
Requer-se a citação do réu, pelo correio, nos
termos dos arts. 246, I; 247 e 248 do CPC/2015.
VI – Audiência de Conciliação
Nos termos do art. 334, § 5º, do CPC/2015, o
autor manifesta desinteresse em autocomposição.
Ou
Tendo em vista a natureza do direito e
demonstrando espírito conciliador, o autor, nos termos do art. 334 do CPC/2015,
manifesta interesse em autocomposição, aguardando a designação de audiência de
conciliação.
VII – Provas
Como prova cabal dos fatos alegados, o autor
junta cópia completa dos autos do processo [...].
VII – Valor da causa
Dá-se à causa o valor de R$ [...].
Termos em que, pede deferimento.
Data Advogado [OAB/...].
Conclusões
Em razão do exposto,
conclui-se:
-
Conforme dispõe o CPC/2015, “caso a
decisão transitada em julgado seja omissa quanto ao direito aos honorários ou
ao seu valor, é cabível ação autônoma para sua definição e cobrança” (art.
85, § 18).
-
Não cabe pedido direto de execução nesse caso.
-
A ação é cabível apenas quando a decisão omissa tenha transitado em julgado a
partir de 18/03/2016, inclusive.
-
Ainda que ocorra reforma integral da decisão recorrida, caso não haja
pronunciamento explícito sobre os encargos da sucumbência no acórdão que
transitou em julgado, a ação é cabível e necessária.
-
A ação está sujeita a prazo prescricional de cinco anos, contados do trânsito
em julgado da última decisão no processo no qual proferida a decisão omissa.
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