quarta-feira, 2 de novembro de 2016

AÇÃO AUTÔNOMA PARA DEFINIÇÃO E COBRANÇA DE HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA


Este post trata exclusivamente do caso em que o credor é advogado privado. Para a advocacia pública existem diferenças que não são tratadas aqui e que ainda devem ser objeto de atos normativos internos de cada órgão.

Introdução

Examino as hipóteses de cabimento de ação autônoma para definição e cobrança de honorários de sucumbência.

A previsão legal dessa ação é recente. Veio com o CPC/2015:

Art. 85. [...] § 18.  Caso a decisão transitada em julgado seja omissa quanto ao direito aos honorários ou ao seu valor, é cabível ação autônoma para sua definição e cobrança.

A opção do legislador corresponde parcialmente ao que defendi em Sentença obscura e trânsito em julgado, obra publicada pela Livraria do Advogado em 2013. Minha tese, que não era especificamente sobre honorários nem sobre omissão, era de que, (1) quando a sentença apresenta um grau de obscuridade que torna impossível a interpretação, ela é citra petita e, como tal, permite nova propositura da ação (p. 83). Por outro lado, (2) quando, apesar de obscura, a sentença ainda admite interpretação, caberia ao juiz da execução interpretá-la e caberia, alternativamente, uma ação autônoma para sua interpretação (p. 124). A ação prevista no CPC/2015, art. 85, § 18, corresponde à primeira hipótese, exclusivamente.

Com a novidade trazida pelo CPC/2015, surgiram dúvidas sobre a forma de operacionalização da ação autônoma, bem como sobre permanência da validade do entendimento do STJ sobre a questão (Súmula 453 vs REsp 1.129.830/SC vs REsp 886.178/RS).

Analisam-se, assim, os seguintes temas: Interpretação do texto legal, sua aplicação no tempo, hipóteses de cabimento da ação autônoma e prazo. Ao final, apresenta-se uma minuta básica de petição inicial.

Interpretação CPC/2015, art. 85, § 18

Decisão transitada em julgado é aquela que passa da situação de recorrível para a de irrecorrível. Normalmente, uma decisão pode transitar em julgado antes que a fase de conhecimento seja encerrada. Isso ocorre, por exemplo, quando algum dos pedidos é julgado, ninguém recorre tempestivamente da decisão desse pedido e alguém recorre do julgamento de outros pedidos não prejudiciais ao pedido irrecorrido. Conforme entendimento jurisprudencial e o CPC/2015, para fins de ação rescisória, não se considera o trânsito em julgado de capítulos, isto é, conta-se o prazo exclusivamente “do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo” (art. 975). No caso dos honorários, ocorre algo parecido, pois mesmo que algum capítulo transite em julgado antes do final da fase de conhecimento, os recursos quanto aos demais capítulos sempre podem ter reflexos no montante final dos honorários (art. 85, § 11). Isso faz com que a definição ou indefinição da verba honorária somente passe em julgado com o trânsito da última decisão proferida no processo.

Decisão omissa é aquela que não se pronuncia a respeito de ponto sobre o qual deveria se pronunciar. Dessa forma, a sentença que decide o mérito, mas não condena o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor, é omissa. O mesmo pode ser dito do acórdão que reforma a sentença, mas não faz a correspondente adequação na condenação em honorários.

A decisão que simplesmente afirma inverter o ônus da sucumbência trata apenas da responsabilidade quanto aos honorários e não do valor destes. Os honorários fazem parte dos encargos (expressão mais adequada do que ônus) da sucumbência. Invertido o encargo, a responsabilidade de arcar com os honorários passa de uma das partes para a outra. Mesmo sem tratar do valor, a decisão que emprega a expressão “invertidos os ônus da sucumbência” é comum na prática forense e não é necessariamente omissa (contra REsp 980.570/RS, que entendeu que apenas custas e despesas seriam encargos da sucumbência, e não os honorários). É possível entender, nesses casos, que o acórdão reformou a sentença quanto ao direito aos honorários, mas manteve-a intacta quanto ao valor. Isso funciona quando o valor estabelecido pela sentença está expresso em moeda corrente ou quando consiste de percentual sobre o valor da causa. Quando, porém, os honorários são fixados em percentual da condenação, e ao final o pedido é julgado improcedente (ou seja, não há condenação), ocorre omissão no que se refere ao valor dos honorários (tratam do tema EDcl no AgRg no AgRg no REsp 1.362.094/MG; REsp 1.272.024/RS; REsp 1.129.830/SC).

Ação autônoma para definição e cobrança não é execução. O entendimento expresso na Súmula 453/STJ continua válido no que se refere à impossibilidade de execução direta da sentença omissa. Confira-se o texto da referida súmula: “Os honorários sucumbenciais, quando omitidos em decisão transitada em julgado, não podem ser cobrados em execução ou em ação própria.” A súmula, contudo, está superada na parte que afirma não caber ação própria, pois esta passou a ser cabível com o novo CPC. A ação prevista no art. 85, § 18, é de rito ordinário e inicia pela fase de conhecimento. Na fase de conhecimento da ação prevista no art. 85, § 18, o juiz definirá o valor e condenará o réu ao pagamento dos honorários, em caso de procedência. Em seguida, sine intervallo, mas a pedido do exequente, passa-se à fase de cumprimento (CPC/2015, art. 513, § 1º).

Aplicação do CPC/2015 no tempo

A aplicação da nova lei processual aos processos em curso sempre foi um tema tormentoso e as DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS do CPC/2015 estão longe de eliminar todas as dúvidas. Sem a preocupação de dar um tratamento teórico completo ao tema, faz-se necessário, ao menos, escolher o caminho que pareça mais seguro para fins práticos.

A teoria dominante na doutrina do direito intertemporal processual é a do sistema de isolamento dos atos processuais (sobre o tema, ver AMARAL, Estudos de direito intertemporal e processo, 2007, p. 20). Por esse sistema, respeita-se a eficácia dos atos já realizados no processo, mas para os atos a praticar na vigência da lei nova, aplica-se esta. Com esse objetivo, o Código diz:

Art. 1.046.  Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

Ocorre que um ato praticado sob a lei anterior pode gerar direitos processuais como, por exemplo, o direito de interpor determinado recurso que na data da prática do ato era cabível (ver Teresa WAMBIER, Os agravos no CPC brasileiro, 2000, p. 487). Em atenção a tal critério, o STJ editou o Enunciado administrativo n. 2:

Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

Esse critério se aplica no caso de processos pendentes.

Quanto aos processos findos, porém, é a coisa julgada que importa. Formada a coisa julgada de acordo com determinada lei processual, ela não perde essa qualidade caso uma lei nova introduza um novo conceito de coisa julgada (ver AMARAL, Estudos de direito intertemporal e processo, 2007, p. 23). Esse é o critério para os processos findos.

Para o tema aqui examinado, importa saber se a decisão transitada em julgado omissa quanto ao direito aos honorários ou ao seu valor faz coisa julgada material ou não. A ausência de coisa julgada material, tanto no CPC anterior (art. 268) como no atual (art. 486), não obsta a que a parte proponha de novo a ação (caso em que caberia a ação prevista no CPC/2015, art. 85, § 18). Quando há coisa julgada material, contudo, a única via possível é a ação rescisória (ou seja, não caberia a ação prevista no CPC/2015, art. 85, § 18).

Parece-me que a omissão quanto ao direito aos honorários ou ao seu valor não faz coisa julgada, na linha da ressalva de voto feita pelo Relator do RESP (repetitivo) 886.178/RS, Ministro Luiz Fux:

Ressalva do Relator no sentido de que o acórdão, que não fixou honorários em favor do vencedor, não faz coisa julgada, o que revela a plausibilidade do ajuizamento de ação objetivando à fixação de honorários advocatícios. Isto porque a pretensão à condenação em honorários é dever do juiz e a sentença, no que no que se refere a eles, é sempre constitutiva do direito ao seu recebimento, revestindo-o do caráter de executoriedade, por isso, a não impugnação tempestiva do julgado, que omite a fixação da verba advocatícia ou o critério utilizado quando de sua fixação, não se submete à irreversibilidade decorrente do instituto da coisa julgada. (REsp 886.178/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Corte Especial, julgado em 02/12/2009, DJe 25/02/2010)

Ocorre que, conforme adiantado, a finalidade deste estudo é prática. Assim, o que importa é que o trecho citado é apenas uma ressalva de voto e a decisão da Corte Especial do STJ, no CPC/1973, foi pelo não cabimento da ação autônoma e reconhecimento de “coisa julgada, passível de modificação apenas mediante o ajuizamento de ação rescisória.” Posteriormente, o precedente levou à edição da Súmula 453:

Os honorários sucumbenciais, quando omitidos em decisão transitada em julgado, não podem ser cobrados em execução ou em ação própria.

Em suma, o STJ entendia que a omissão fazia coisa julgada material, pois somente esta impede a ação própria com um dos objetos da ação anterior.

A súmula restou parcialmente superada pelo CPC/2015, que seguiu a corrente doutrinária que me parece mais correta. A súmula ficou superada pela lei apenas na parte que veda a ação própria. Está mantida na parte que veda execução pura e simples de honorários, sem que a decisão transitada em julgado os tenha fixado. Note-se que o CPC/2015, art. 85, § 18, necessariamente adota o entendimento de que o ponto omitido não faz coisa julgada material.

Note-se que tanto a Súmula 453/STJ como CPC/2015, art. 85, § 18, tratam de decisão transitada em julgado, o que reforça a conclusão de que é a data do trânsito em julgado o elemento que define a aplicação do CPC antigo ou do novo, nesse caso. O trânsito em julgado deve ser o marco para a escolha da lei aplicável quando se trata de ação nova. A data da publicação da decisão (critério adotado pelo STJ para os recursos) serve apenas como elemento de conexão para eleição da lei aplicável aos processos pendentes, não aos transitados em julgado. No processo pendente, verifica-se uma conexão entre o ato anterior e o posterior, há uma sequencia concatenada de atos, o que algumas vezes faz com que o ato posterior, mesmo na vigência da lei nova, deva ser praticado de acordo com a lei antiga, vigente na data do ato anterior. Não fosse assim, nos casos em que a lei nova deixasse de prever determinado recurso, as partes seriam privadas de um recurso que poderiam, legalmente, ter interposto antes da alteração legal, o que viola o direito adquirido. Uma decisão omissa proferida antes de 18/03/2016 permanece regida pelo CPC/1973 quanto ao recurso cabível. Mas, uma vez passado o prazo para o recurso e ocorrido o trânsito em julgado, aquela decisão anterior a 18/03/2016 já não tem conexão com os atos futuros, até porque, com o trânsito em julgado, “considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido” (CPC/2015, art. 508).

De todo o exposto, aceitando a súmula 453/STJ como correta, apenas para fins práticos, e parcialmente superada pelo CPC/2015, conclui-se que a ação autônoma para definição e cobrança de honorários é cabível apenas quando a decisão omissa tenha transitado em julgado a partir de 18/03/2016, inclusive.

Hipóteses de cabimento: a tese da decisão implícita

A hipótese de cabimento da ação própria é a de sentença omissa transitada em julgado, tal qual definido acima.

Pode surgir alguma dúvida quanto à necessidade da ação frente ao entendimento que o STJ adotou em alguns julgados, no sentido de que a reforma integral da decisão recorrida permitiria ver uma condenação implícita, consistente na inversão dos encargos da sucumbência, entre eles os honorários. Nessa linha:

A reforma in totum do acórdão ou da sentença acarreta inversão do ônus da sucumbência, ainda que não haja pronunciamento explícito sobre esse ponto. Precedentes. (REsp 1129830/SC, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 23/02/2010, DJe 08/03/2010)

1. Havendo modificação do meritum causae, ocorre a inversão dos ônus sucumbenciais; nesse caso, o órgão julgador estará acolhendo ou rejeitando o pedido inicial, decorrendo, disso, as despesas processuais e os honorários advocatícios. 2. Como não houve, na decisão recorrida, menção expressa à inversão da sucumbência, embora referida inversão seja efeito implícito da decisão, são cabíveis embargos de declaração para esclarecer esse fato. Embargos de declaração acolhidos, para sanar a omissão, sem efeitos infringentes, com expressa inversão da sucumbência (EDcl no REsp. Nº 892.119 - RS, Segunda Turma, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 2.12.2008)

Se o acórdão, em dando provimento integral a apelação, reverteu o dispositivo da sentença reformada, sem fazer referência aos ônus da sucumbência, é de se entender tenha, por igual, invertido a condenação imposta na decisão reformada. (EREsp 53.191/SP, Corte Especial, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJU 28.02.2000).

Esse entendimento ainda é adotado em alguns julgados recentes, como, por exemplo, nos EDcl no REsp 1.184.500/RS, julgados em 19/04/2016, e nos EDcl no REsp 1556350/RS, julgados em 23/02/2016.

Nada obstante, parece-me que a ação autônoma para definição e cobrança dos honorários é perfeitamente cabível, e até mesmo necessária, nos casos que poderiam, teoricamente, se enquadrar na jurisprudência citada. São três as razões desse entendimento:

Primeiro, porque o entendimento jurisprudencial citado era incorreto e violava inclusive a Constituição. O pedido implícito é possível, desde que previsto em lei (CPC/2015, art. 322, § 1º), mas decisão implícita não, até porque toda a decisão precisa ser fundamentada (CRFB/1988, art. 93, IX). A decisão que não julga um pedido, seja ele implícito ou explícito, é simplesmente omissa.

Segundo, porque o entendimento citado já estava superado pela jurisprudência do STJ, ainda na vigência do CPC/1973. Existem realmente julgados recentes que ainda sustentam a ocorrência de decisão implícita quanto aos honorários. Contudo, são geralmente acórdãos da Segunda Turma e não posição pacífica. A corrente oposta, que entende que a omissão corresponde à ausência de condenação, tem se mostrado predominante, tanto que prevaleceu no julgamento do Recurso Especial repetitivo 886.178/RS, levou à edição da Súmula 453/STJ e, em período mais recente, prevaleceu no julgamento do EREsp 1.285.074/SP, todos da Corte Especial. Nos Embargo de Divergência 1.285.074/SP, aliás, o paradigma invocado pela embargante foi justamente o REsp 1.129.830/SC, que adotava o seguinte posicionamento: “A reforma in totum do acórdão ou da sentença acarreta inversão do ônus da sucumbência, ainda que não haja pronunciamento explícito sobre esse ponto.” Ao rechaçá-lo, a ementa do acórdão do EREsp 1.285.074/SP diz que o “acórdão paradigma ostenta posicionamento superado”.

Terceiro, porque o entendimento citado está superado pela previsão de ação autônoma para o caso, pelo CPC/2015. Não há dúvida de que a falta de pronunciamento quanto aos honorários, seja na sentença ou em acórdão que reforma decisão anterior, em qualquer instância, representa omissão. E, para esse caso, o CPC/2015, art. 85, § 18, trouxe nova solução. Logo, não pode prevalecer a solução anterior. Além do mais, a jurisprudência buscava dar solução a um problema: uma vez que o STJ entendia que a coisa julgada abrangia inclusive o pedido de honorários, mesmo sem decisão quanto a estes, a jurisprudência buscou evitar a penalização advogado que trabalhou no processo, teve sucesso na demanda, e por um lapso seu, mas também do tribunal, ficaria sem a sua remuneração. Com o CPC/2015, esse problema desapareceu, não se justificando a permanência da solução antiga.

Convém diferenciar “inversão da sucumbência” de “inversão do ônus da sucumbência”. Inverter a sucumbência é simplesmente tornar vencedor quem até então era vencido, e vice-versa. Essa expressão nada diz quanto aos honorários. Diversamente, inverter o ônus da sucumbência é inverter a responsabilidade pelos encargos que decorrem da sucumbência. Essa expressão inclui a condenação em honorários. Muito frequentemente, porém, essas expressões não são usadas de forma técnica. Será importante, em todos os casos, buscar descobrir, pelo contexto, o sentido no qual a expressão foi utilizada. O que importa é que, quando o acórdão afirma inverter o ônus da sucumbência, mesmo que o diga com outras palavras, ele está condenando uma das partes a arcar com os honorários de sucumbência. Ocorre que, muitas vezes, a mera inversão leva à omissão quanto ao valor dos honorários. É o caso, por exemplo, quando a sentença condena em percentual sobre a condenação e, com a reforma pelo acórdão, pedido julgado improcedente, a condenação (ao principal) desaparece.

As diferentes situações podem ser visualizadas no seguinte quadro:

Sentença (ou acórdão regional)
Acórdão
Solução
Omissa quanto ao responsável pelos honorários ou quanto ao valor
-------
Ação autônoma
Condena o vencido a honorários (qualquer base de cálculo)
Reforma a decisão recorrida mas não trata dos honorários
Ação autônoma
Reconhece a improcedência e condena o vencido a honorários sobre o valor da causa (ou valor fixo)
Reforma integralmente (pedido procedente) e inverte expressamente os ônus (encargos) da sucumbência
Pedido de cumprimento nos mesmos autos
Reconhece a procedência do pedido e condena o vencido a honorários sobre o valor da condenação
Reforma integralmente (=pedido improcedente) e inverte expressamente os ônus (encargos) da sucumbência
Ação autônoma


Em conclusão: ainda que ocorra reforma integral da decisão a quo, caso não haja pronunciamento explícito sobre os encargos da sucumbência no acórdão ad quem e este venha a transitar em julgado na vigência do CPC/2015, a ação prevista no CPC/2015, art. 85, § 18, será cabível e necessária.

Prazo

Para saber se a ação em questão está sujeita a prazo, é necessário, antes, saber se ela estaria sujeita a prazo prescricional ou decadencial. Isso porque a prescrição pode incidir por critério residual (CC/2002, art. 205) enquanto a decadência precisa estar prevista em lei ou convenção.

A classificação não é tranquila, mas um critério frequentemente tomado como ponto de partida é o da ação adequada para a tutela de cada tipo de direito. Agnelo Amorim Filho resume-o da seguinte forma:

1) - Estão sujeitas a prescrição (indiretamente, isto é, em virtude da prescrição da pretensão a que correspondem): - tôdas as ações condenatórias, e somente elas (arts. 177 e 178 do Cód. Civil);

2) - Estão sujeitas a decadência (indiretamente, isto é, em virtude da decadência do direito potestativo a que correspondem): - as ações constitutivas que têm prazo especial de exercício fixado em lei;

3) - São perpétuas (imprescritíveis): - a) as ações constitutivas que não têm prazo especial de exercício fixado em lei; e b) tôdas as ações declaratórias.

(AMORIM FILHO, Critério científico para distinguir a prescrição da decadência e para identificar as ações imprescritíveis, 1962, p. 131)

Resta avaliar o direito aos honorários de sucumbência por esse critério. Segundo o CPC/2015, art. 85, “A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.” O mesmo constava do CPC/1973, art. 20. Logo, o provimento adequado à tutela do direito aos honorários de sucumbência é o condenatório e o prazo para o seu exercício é prescricional. Da sucumbência surge o direito aos honorários e com o trânsito em julgado da decisão omissa, ocorre a violação ao direito, e “violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição” (CC/2002, art. 189).

Tanto o CC/2002, art. 206 como o EOAB/1994 fixam prazo prescricional aplicável ao caso. Felizmente, o prazo em ambas as leis é idêntico: cinco anos. Confira-se:

Lei n. 8.906/1994 (EOAB). Art. 25. Prescreve em cinco anos a ação de cobrança de honorários de advogado, contado o prazo: [...] II - do trânsito em julgado da decisão que os fixar; [...] IV - da desistência ou transação; [...].

Lei n. 10.406/2002 (CC). Art. 206. Prescreve: [...] § 5o Em cinco anos: [...] II - a pretensão dos profissionais liberais em geral, procuradores judiciais, curadores e professores pelos seus honorários, contado o prazo da conclusão dos serviços, da cessação dos respectivos contratos ou mandato; III - a pretensão do vencedor para haver do vencido o que despendeu em juízo.

Ambos os dispositivos apresentam certas dificuldades de aplicação à ação prevista no CPC/2015, art. 85, § 18.

Quanto ao EOAB/1994, ele trata apenas da ação de cobrança e ainda diz que o prazo é contado da decisão que fixar os honorários. Mas a ação prevista pelo CPC/2015 não é simplesmente de cobrança, mas de definição e cobrança, sendo que primeiro é preciso a definição para depois haver a cobrança, no mesmo processo. Além disso, na hipótese em estudo, não há uma decisão que fixa os honorários, mas uma decisão que dá vitória a uma das partes (ou a ambas, parcialmente), o que constitui suporte fático para as normas legais relativas aos honorários de sucumbência. O EOAB/1994 tratou apenas da situação normal: uma sentença que fixa os honorários. Não cuidou do caso da sentença omissa.

Quanto ao CC/2002, art. 206, o inciso II é bastante amplo. Ele trata da pretensão aos honorários, e não apenas da sua cobrança. Além disso, não se restringe às verbas de origem contratual. Por essas razões, esse dispositivo é o que regula o prazo para a ação do CPC/2015, art. 85, § 18. A jurisprudência a respeito é escassa. Um dos poucos julgados do STJ sobre o tema apoia o entendimento aqui defendido:

CIVIL E PROCESSO CIVIL. HONORÁRIOS. CONTRATAÇÃO VERBAL. COBRANÇA. PRESCRIÇÃO. PRAZO. CONTAGEM. DIES A QUO. DISPOSITIVOS LEGAIS ANALISADOS: ARTS. 25 DA LEI Nº 8.906/94 E 206, § 5º, II, DO CC/02. [...] 4. Embora, com base no princípio da especialidade, a regra específica do art. 25, II, da Lei nº 8.906/94 deva prevalecer sobre o comando geral do art. 206, § 5º, II, do CC/02, aquela norma legal se refere exclusivamente à prescrição da ação de cobrança de honorários de advogado, inexistindo qualquer alusão à ação de arbitramento. Portanto, ausente no Estatuto da OAB comando específico para a tutela da prescrição da ação de arbitramento de honorários advocatícios, aplica-se a regra geral contida no Código Civil, cuja redação é mais abrangente, comportando inclusive a pretensão de fixação da verba. 5. Embora pormenorizadas, as hipóteses enumeradas no art. 25 da Lei nº 8.906/94 se subsumem na previsão do art. 206, § 5º, II, do CC/02, de sorte que, independentemente da norma aplicada, o prazo prescricional para exercício da pretensão de arbitramento e/ou cobrança dos honorários advocatícios judiciais verbalmente contratados será sempre de 05 anos, contado do encerramento da prestação do serviço (trânsito em julgado da decisão final ou último ato praticado no processo, conforme o caso). 6. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp 1358425/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 08/05/2014, DJe 26/05/2014)

Em conclusão, a ação prevista no CPC/2015, art. 85, § 18, está sujeita a prazo prescricional de cinco anos, contados do trânsito em julgado do processo em que proferida a decisão omissa. Base legal: CC/2002, art. 206, II.

Minuta básica

(modelo adaptado a partir de SCAVONE JÚNIOR, Luiz Antonio. Modelos de peças no novo Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 157-160)

EXCELENTÍSSIMO(A) JUIZ(A) DA ___ VARA _____________



[...], em causa própria, vem, com base CPC/2015, art. 85, § 18, propor AÇÃO PARA DEFINIÇÃO E COBRANÇA DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA em face de [...], o que faz com apoio nos argumentos de fato e de direito que passa a expor:

I – Fatos

O autor atuou diligentemente no processo [...] e conseguiu ver reconhecido o direito de seu cliente. No entanto, o acórdão que reformou integralmente a sentença de procedência, dando assim vitória ao Réu na ação anterior, deixou de manifestar-se sobre os honorários de sucumbência. Sendo assim, diante da impossibilidade de arbitrar unilateralmente a verba sucumbencial, bem como de executá-la sem condenação expressa (STJ 453), não restou alternativa ao autor senão a propositura da presente ação.

II – Direito

Conforme o Estatuto da OAB:

Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência. [...]

Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor.

E conforme o CPC/2015:

Art. 85.  A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. [...]

§ 14.  Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial. [...]

§ 19.  Os advogados públicos perceberão honorários de sucumbência, nos termos da lei.

A lei deixa claro, portanto, que a sucumbência da parte vencida a torna devedora de honorários advocatícios e que o juiz deve proferir condenação ao seu pagamento.

III – Demonstração do valor devido

No processo [...], o pedido foi julgado integralmente improcedente. No que se refere aos honorários advocatícios, a situação é regida pelo CPC/2015, art. 85, § 4º: 

§ 4o Em qualquer das hipóteses do § 3o:

III - não havendo condenação principal ou não sendo possível mensurar o proveito econômico obtido, a condenação em honorários dar-se-á sobre o valor atualizado da causa;

O valor da causa, nos autos originários, era de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), hipótese na qual incide um percentual mínimo de oito e máximo de dez por cento (CPC/2015, art. 85, § 3º, II). Levando em conta a complexidade da causa [...descrever...], o zelo do advogado que atuou no feito [... descrever....], e que a vitória somente foi obtida em grau recursal (§ 11), o percentual merece ser fixado no máximo legal.

IV – Pedido

Em razão do exposto, o/a autor pede seja o réu condenado:

(1) a pagar honorários de sucumbência referentes ao processo [...] no montante de R$ 100.000,00, corrigido desde [...data da inicial originária ...] e com juros a contar da citação da presente demanda.

(b) nas despesas, custas e honorários advocatícios referentes à presente demanda, na forma da lei.

V – Citação

Requer-se a citação do réu, pelo correio, nos termos dos arts. 246, I; 247 e 248 do CPC/2015.

VI – Audiência de Conciliação

Nos termos do art. 334, § 5º, do CPC/2015, o autor manifesta desinteresse em autocomposição.

Ou

Tendo em vista a natureza do direito e demonstrando espírito conciliador, o autor, nos termos do art. 334 do CPC/2015, manifesta interesse em autocomposição, aguardando a designação de audiência de conciliação.

VII – Provas

Como prova cabal dos fatos alegados, o autor junta cópia completa dos autos do processo [...].

VII – Valor da causa

Dá-se à causa o valor de R$ [...].

Termos em que, pede deferimento.

Data Advogado [OAB/...].



Conclusões

Em razão do exposto, conclui-se:

- Conforme dispõe o CPC/2015, “caso a decisão transitada em julgado seja omissa quanto ao direito aos honorários ou ao seu valor, é cabível ação autônoma para sua definição e cobrança” (art. 85, § 18).

- Não cabe pedido direto de execução nesse caso.

- A ação é cabível apenas quando a decisão omissa tenha transitado em julgado a partir de 18/03/2016, inclusive.

- Ainda que ocorra reforma integral da decisão recorrida, caso não haja pronunciamento explícito sobre os encargos da sucumbência no acórdão que transitou em julgado, a ação é cabível e necessária.

- A ação está sujeita a prazo prescricional de cinco anos, contados do trânsito em julgado da última decisão no processo no qual proferida a decisão omissa.

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