Art. 79. Não
se aplica o disposto no art. 103 desta Lei ao pensionista menor, incapaz ou ausente, na forma da lei. (Revogado em 18/01/2019)
Art. 103. [...]
Parágrafo único. Prescreve em cinco anos, a contar da data em que deveriam ter
sido pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer
restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social, salvo o direito dos
menores, incapazes e ausentes, na forma
do Código Civil.
A
data de início do prazo prescricional (ou final do impedimento do prazo
prescricional) tem relevância (a) para o recebimento de parcelas em atraso, que
eram devidas mas não foram pagas à época própria; e (b) também para retroação
do início da pensão, conforme regras estabelecidas no art. 74 da Lei n.
8.213/1991: da data do óbito ou da data de requerimento, se requerido dentro de
30 dias ou após 30 dias contados do óbito (atualmente 180 dias),
respectivamente.
O
prazo para requerimento (atualmente 180 dias), que gera o direito de receber a
pensão desde o óbito, não era entendido pelo INSS como um prazo prescricional. Tratava-se, entendia o
INSS, de simples regra sobre a data de início do benefício (DIB) de pensão, da
mesma forma que existem regras que definem a DIB de todas as demais espécies de
benefícios. Conforme o Código Civil, diploma que contém as normas basilares
sobre a prescrição no direito brasileiro, “Violado
o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela
prescrição” (art. 189). Ora, não ocorre qualquer violação de direito na
não-implantação de benefício antes do requerimento pelo interessado, pois não
existe norma que o determine. Aliás, não existe nem mesmo norma que o permita. De
toda forma, não cabe um desenvolvimento maior do tema, pois diante das
reiteradas manifestações dos tribunais no sentido de que os prazos do art. 74
têm natureza prescricional e,
portanto, não correm contra certas pessoas definidas na lei civil, o INSS
adequou seus normativos ao entendimento jurisprudencial, inclusive como forma
de prevenir litígios.
Trata-se,
portanto, de saber se a idade na qual começam a contar os prazos prescricionais
do Direito Previdenciário é a de 16 anos ou a de 18 anos.
A
Lei n. 8.213/1991, nos seus artigos 79 e 103, não primou pela precisão. “Menores”
podem ser os menores de 16 (CC art. 3º) ou os menores de 18 (CC art. 4º, I).
“Incapazes” podem ser os absolutamente incapazes (art. 3º) ou os relativamente
incapazes (art. 4º). “Ausentes” podem ser os “ausentes do País em serviço
público” (CC art. 198 II) ou os desaparecidos, previstos no CC anterior como
absolutamente incapazes, mas no CC/2002 como presumidamente mortos (art. 6º). É
certo que o art. 5º do CC/2002 diz que a “menoridade cessa aos dezoito anos
completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida
civil”, mas esse artigo está se referido apenas à menoridade remanescente
depois de cessada, logicamente, a menoridade relativa aos 16 anos. Como se
sabe, existem diferentes menoridades (eleitoral, penal, civil ...). No que se
refere à prescrição, a menoridade
que interessa cessa aos 16 anos (art. 198 do CC/2002).
Poderia
ser diferente na lei previdenciária? Sim, poderia, mas seria, no mínimo,
necessária uma ressalva expressa à regra do Código Civil. A lei previdenciária
não fez ressalvas e nem contém qualquer indicativo de que estaria adotando
critério diverso daquele do Código Civil. Pelo contrário, no art. 103 remete
explicitamente ao Código Civil. E o art. 79, atualmente revogado, remetia ao
art. 103.
Há
que se interpretar as normas de forma sistemática, a fim de dar alguma
coerência ao ordenamento. Inclusive para admitir outros casos de impedimento da
prescrição que nem sequer estão expressos na lei previdenciária, como o dos “que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de
guerra” (CC, art.
198, III).
Aqui
vale a lição de Pietro Perlingieri:
A questão não
reside na disposição topográfica (códigos, leis especiais), mas na correta individuação dos problemas. A
tais problemas será necessário dar uma
resposta, procurando-a no sistema como um todo, sem apego à preconceituosa
premissa do caráter residual do código e, por outro lado, sem desatenções às
leis cada vez mais numerosas e fragmentadas. [...] O trabalho de reconstrução do sistema, mediante a
interpretação, faz-se sempre mais
difícil por causa da instabilidade e contraditoriedade das opções de
política do direito e pela variabilidade dos conteúdos das regulamentações dos
institutos jurídicos, pelo uso pouco
prudente, freqüentemente descuidado e inadequado, das técnicas legislativas. (Pietro
Perlingieri, Perfis do Direito Civil,
1997, p. 6 e 24)
Analisemos
o sistema. A prática de ato jurídico exige agente
capaz. Agente capaz é o sujeito
dotado de capacidade. A capacidade pode classificar-se de dois modos:
quanto à natureza e quanto à extensão. Quanto à natureza, classifica-se em de direito e de fato. A capacidade de
direito é a capacidade de gozo,
atributo da personalidade, o que não quer dizer que todos tenham todos os
direitos. Certas pessoas não podem ter certos direitos. A capacidade de fato ou
de exercício é a que permite à pessoa, por si mesma, levar a efeito o uso e
gozo de diversos direitos. Essa capacidade está sujeita a muitas limitações. O
Código Civil trata da capacidade estabelecendo as hipóteses de sua ausência,
isto é, os casos de incapacidade.
A ordem
jurídica priva certas pessoas do exercício por si dos direitos, estabelecendo incapacidades. (Orlando Gomes, Introdução ao Direito Civil, p. 129).
Quanto
à extensão da incapacidade, ela se classifica em absoluta e relativa.
A
incapacidade absoluta só pode ser de
fato (também dita de exercício), pois
sempre que há personalidade há um mínimo de capacidade de direito. A incapacidade absoluta, portanto, é o impedimento total para o exercício pessoal dos atos da vida civil.
A
incapacidade relativa refere-se apenas a “certos
atos ou à maneira de os exercer”.
Mesmo
que os relativamente incapazes não
possam praticar pessoalmente certos atos, o Código Civil não os excepciona dos efeitos da prescrição (ver CC art. 198).
Diversamente,
os absolutamente incapazes, em razão
do impedimento total para os atos da
vida civil, têm seus direitos resguardados da prescrição (ver CC art. 198).
Tendo
essas noções presentes, pode-se tratar do instituto da prescrição. Conforme ensina Pontes de Miranda, o instituto da
prescrição "serve à segurança e à paz públicas" (Tratado de Direito Privado T. VI, 1970, § 662). Sendo esse o
objetivo da existência de prazos prescricionais, a possibilidade de
exercício da pretensão e o início do prazo prescricional “são fatos correlatos, que se correspondem
como causa e efeito” (nas palavras de Agnelo Amorim Filho, Critério científico ..., 1961). Em
outras palavras, para que o prazo prescricional tenha início, é necessário que
o titular da pretensão tenha capacidade
de exercê-la. Tendo capacidade para exercer a pretensão (capacidade de fato), a
inércia pelo prazo previsto em lei acarreta a prescrição.
Com
essas noções básicas, cabe perguntar: o
maior de 16 anos tem capacidade de exercer pessoalmente seus direitos junto à Previdência?
Sem dúvida! Com 16 anos de idade, o
segurado ou dependente é totalmente capaz para, por conta própria, requerer benefícios e receber os pagamentos,
sem necessitar de representação ou assistência por quem quer que seja.
Confira-se:
INSTRUÇÃO
NORMATIVA Nº 77 /PRES/INSS, DE 21 DE JANEIRO DE 2015
Art. 512. [...]
Parágrafo único. O titular do benefício, após
dezesseis anos de idade, poderá receber
o pagamento independentemente da presença dos pais ou tutor.
Art. 673.
[...] § 2º O segurado e o dependente, maiores
de dezesseis anos de idade, poderão firmar
requerimento de benefício, independentemente da presença dos pais ou tutor,
observando que seus pais ou tutor poderão representá-los perante a Previdência
Social até a maioridade civil, ou seja, dezoito anos.
Note-se:
na lei civil, a prescrição corre contra o relativamente
incapaz (o maior de dezesseis), mesmo que este não tenha capacidade de fato
para exercer todos os seus direitos.
Na lei previdenciária, o maior de
dezesseis (relativamente incapaz) possui
capacidade plena para o exercício de
seus direitos previdenciários. Isto é, os direitos previdenciários estão
entre aqueles que ele pode exercer diretamente. Logo, não faria sentido algum
que a prescrição não corresse contra esse segurado ou dependente. Não há como
justificar o impedimento da prescrição em razão da idade quando o agente possui capacidade
de fato para exercer a pretensão. Essa compreensão torna claro que, quando o
art. 103 (e o antigo art. 79) da Lei n. 8.213/1991 fala em “menor” está se
referindo ao menor de 16 anos absolutamente incapaz (não emancipado).
Na
jurisprudência, há julgados nos dois sentidos (16 ou 18 anos). Cito alguns julgados
recentes que adotam o marco dos 16 anos de idade:
[...] 1. O
recorrente afirma que houve, além de divergência jurisprudencial, ofensa aos arts.198 do CC/2002; 74, I, 79 e 103,
parágrafo único, da Lei 8.213/1991. Sustenta que "A questão cinge-se à
possibilidade de a parte autora, menor de idade, receber as diferenças da
pensão por morte, compreendida entre a datado óbito e a data da implantação
administrativa, considerando ter requerido a concessão do benefício após o
prazo de trinta dias". 2. O acórdão recorrido está em sintonia com o atual
entendimento do Superior Tribunal de Justiça quando afirma que a DIB coincide
com o óbito do segurado, não correndo a
prescrição contra o absolutamente
incapaz, no caso o menor de 16 anos, e que, com o implemento dos 21 anos,
tornam-se automaticamente prescritas apenas as parcelas não reclamadas há mais
de cinco anos, razão pela qual não merece prosperar a irresignação. [...] (REsp
1797573/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
21/05/2019, DJe 19/06/2019)
[...]. 2. Consigne-se
que, em se tratando de absolutamente incapaz, não há falar
em aplicação do disposto no art. 28 da Lei 3.765/1960, o qual prevê a
prescrição das parcelas vencidas há mais de 5 anos da interposição do processo
judicial, uma vez que o menor não poderia ser penalizado pela eventual desídia
de seu responsável. Logo, não corre a prescrição contra menores impúberes (inteligência do artigo 198, inciso I do
Código Civil de 2002, c.c. artigo 103, parágrafo único, da Lei 8.213/1991).
[...] (REsp 1697648/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado
em 21/11/2017, DJe 19/12/2017)
PREVIDENCIÁRIO.
PENSÃO POR MORTE. FILHO ABSOLUTAMENTE INCAPAZ À ÉPOCA DO FALECIMENTO DO
GENITOR. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO POSTERIOR À RELATIVIZAÇÃO DA INCAPACIDADE.
TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. DATA DO ÓBITO DO GENITOR. 1. Em se tratando de menor absolutamente
incapaz à época do falecimento do pai, milita em seu favor cláusula
impeditiva da prescrição (art. 198, I, do CC). [...]. (AgInt no REsp
1572391/SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/02/2017,
DJe 07/03/2017)
[...] 2. Não
corre prescrição contra o menor absolutamente incapaz, não se lhe
podendo aplicar, dest'arte, a regra do art. 74, II da Lei 8.213 /91, sendo,
portanto, devido o benefício de pensão por morte aos dependentes menores desde
a data do óbito do mantenedor. Precedentes: AgRg no Ag 1.203.637/RJ, 5T, Rel.
Min. LAURITA VAZ, DJe 3.5.2010; REsp. 1.141.465/SC, 6T, Rel. Min. ALDERITA
RAMOS DE OLIVEIRA (Desembargadora Convocada do TJ/PE), DJe 06.02.2013. 3.
Agravo Regimental do INSS desprovido. (AgRg no AREsp 269.887/PE, Rel. Ministro
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/03/2014, DJe
21/03/2014)
AGRAVO
REGIMENTAL. ADMINISTRATIVO. REINCLUSÃO DE EX-POLICIAL MILITAR POST MORTEM.
PENSÃO. MENOR IMPÚBERE. DEPENDÊNCIA
ECONÔMICA. AFRONTA AO ART. 165 DO CÓDIGO CIVIL. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. 1.
Sendo o Autor absolutamente incapaz, em face da sua menoridade, resta
configurada causa impeditiva da fluência do prazo prescricional, nos termos do art. 198, inciso I, do atual Código Civil
(antigo art. 169, inciso I, do Código Civil de 1916). Precedentes. 2. Agravo
regimental desprovido. (AgRg no Ag 1203637/RJ, Rel. Ministra LAURITA VAZ,
QUINTA TURMA, julgado em 06/04/2010, DJe 03/05/2010)
PREVIDENCIÁRIO
– PENSÃO POR MORTE – REQUERIMENTO – PRAZO SUPERIOR A 30 (TRINTA) DIAS –
PRESCRIÇÃO – PARCELAS DEVIDAS DA DATA DO REQUERIMENTO – ART. 74, II DA LEI Nº
8.213/91 – MENOR ABSOLUTAMENTE
INCAPAZ – INAPLICABILIDADE – PENSÃO DEVIDA A PARTIR DO ÓBITO – INCIDENTE
PROVIDO. 1) A prescrição é a perda de
uma pretensão em razão de sua não exigência no prazo legalmente estabelecido.
A ausência de exigência do benefício de pensão por morte no prazo fixado em lei
(até 30 dias após o óbito), leva à perda da pretensão respectiva, no que se
refere às parcelas pretéritas, evidenciando, aí, a perda decorrente da
prescrição. 2) O fato de não haver na norma que fixa aquele prazo qualquer
referência aos incapazes, outorgando-lhes um tratamento diferenciado, não
significa para o intérprete desconsiderar a interconexão dela com as demais que integram o sistema. 3) Diante
da evidente natureza jurídica prescricional, é certa a impossibilidade do curso do prazo previsto no art. 74 da Lei nº
8.213/91, em relação aos incapazes.
Incidência do art. 169, I, c/c o art. 5º, I do Código Civil de 1916. 4) Pedido
de Uniformização provido. (TNU, 200638007463304, JUIZ FEDERAL RICARLOS ALMAGRO
VITORIANO CUNHA, DJ 13/05/2010)
[...]
Tratando-se os autores de menores absolutamente incapazes, fazem eles
jus ao recebimento do benefício de pensão por morte de seu genitor a contar da
data do óbito, uma vez que não corre a
prescrição contra os absolutamente
incapazes. [...]. (TRF4, AC 5008294-70.2016.4.04.7202, TURMA REGIONAL
SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em
03/07/2019)
[...] 3. A Lei de Benefícios remete ao Código Civil o critério de
fluência da prescrição, no caso de direito de menores, incapazes e
ausentes. O Código Civil de 2002, em seus artigos 3º, II, e 198, I, impedia a
fruição do prazo prescricional contra os absolutamente
incapazes, reconhecendo como tais aqueles que, por enfermidade ou
deficiência mental, não tivessem o necessário discernimento para a prática
dos atos da vida civil. 4. A Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com
Deficiência) alterou a norma antes referida e manteve apenas como absolutamente
incapazes os menores de 16 anos.
[...]. (TRF4, AC 5058114-44.2014.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS
SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 21/06/2019)
Concluo,
em razão do exposto, que o
prazo prescricional para o exercício de qualquer pretensão previdenciária
somente se inicia quando seu titular adquire capacidade de exercê-la, fato que
ocorre aos dezesseis anos de idade ou com a emancipação, o que ocorrer primeiro.
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